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Paola Antony

Dillo



Dillo é compositor, cantor e um dos grandes guitarristas de Brasília, um artista importante na cena e na história musical da cidade. Sempre presente nos grandes palcos, é um instrumentista muito competente e artista compromissado, talentoso, criativo e incansável.

Dillo tem 5 discos lançados e videoclipes excelentes espalhados pela internet, entre outras ideias que, a qualquer hora, chegarão por aí.

Paola Antony – Dillo, eu estava lembrando que você, criança, tocava sanfona. Instrumento difícil para uma criança tocar, não?

Dillo – É, bem difícil. Mesmo para um adulto, porque você perde seu centro de gravidade ao tocar. Você não tem uma atuação boa com ela, porque, além dos acionamentos, das chaves, você tem de movimentar o fole. É um instrumento que precisa dessa mecânica para emissão dos sons. Você tem de ir nas chaves certas, projetar a emissão sonora, e ainda é um trambolho, uma mochila de 40 quilos.

Paola Antony – É linda a sanfona!

Dillo – Ah, é linda, maravilhosa, fantástica.

Paola Antony – O que me impressionou foi pensar que uma criança que toca sanfona já é muito ligada à música, não é isso?

Dillo – Ah, não, não dá para romantizar isso, não. Fui forçado. Meu pai foi um sanfoneiro pernambucano, tirano, que me forçou a tocar sanfona. Não tem nada disso, ah, eu quero aprender um instrumento e quero tocar sanfona; foi pura opressão. Filho de cabra macho tem de tocar sanfona.

Paola Antony – Você se libertou, então, com a guitarra?

Dillo – Acabei de destruir o castelinho romântico da sua imaginação, né?

Paola Antony – Caramba, eu estou rindo para não chorar. Que coisa! Mas alguma coisa boa seu pai fez por você, que foi fazer você se ligar à música.

Dillo – Sim, e eu gosto pra caramba. Eu gosto de acordeon e gosto das músicas que eu tocava, que eram de Luiz Gonzaga.

Paola Antony – Você, inclusive, usou a sanfona em alguns dos seus discos, não foi? No Mestiço, por exemplo.

Dillo – Sim. No Mestiço, eu toco sanfona numa música chamada Festa de Rock e numa outra, Menina do Rio.

Paola Antony – Quando que você mudou da sanfona para a guitarra?

Dillo – Adolescência, rebeldia. Clipe do Jimi Hendrix botando fogo na guitarra. Havia outros clipes também. Eu me lembro do Erik Clapton, quando a Band exibiu o show 24 nights em 1990. Meu cunhado tinha acabado de comprar a novidade do momento, que era o videocassete, e nós gravamos esse show. O videocassete dele ficava lá em casa e eu assisti repetidas vezes. É engraçado, falando isso agora é que eu me lembrei disso, não é uma coisa de que eu lembro muito. Mexemos em algum bauzinho. Isso foi muito marcante. E a coisa de guitarra, meu, é um instrumento muito emotivo; a sanfona também é, mas a guitarra, além de ser portátil, alcança um nível de emoção enorme, pelo menos em mim, toca em lugares mais profundos. Eu sou um sanfoneiro medíocre e sem vaidade, mas sou um guitarrista fluente.

Paola Antony – Dillo, você, ao longo de sua trajetória, tocou com um monte de gente, não foi?

Dillo – Sim, e o primeiro foi o Renato Matos. Uma escola. Renato Matos tinha uma casa em Olhos d’Água, no interior do Goiás, ali perto de Alexânia, onde tem a Feira do Troca. Eu ia para lá, quando era jovem, por conta dessa feira. Lá havia um coreto. A banda em que eu tocava nessa época chamava-se Marssal, e a mãe do Marssal tinha uma casinha lá. A permanência nesse ambiente acabou me levando para a casa do Renato Matos e ele me viu tocando. Eu, modéstia à parte, já era fluente na guitarra. Foi curioso, porque eu não fiquei um tempão aprendendo a tocar guitarra, eu transferi o conhecimento da sanfona para a guitarra e, em quatro meses, eu já tocava melhor do que muita gente ao meu redor. Isso me deu algum destaque, outras pessoas me viram tocando com o Renato Matos e me chamaram para tocar.

Com o Renato Matos eu aprendi muito sobre compor, do refrão, da música. Os shows com eles eram muito divertidos e eu sempre deparava com uma situação de desconstrução, às vezes ele falava alguma coisa que a plateia entendia mal e ele pedia "vaia pra nós, vaia pra nós" e todo mundo ficava vaiando, mas vaia pra nós, para o público, né? O público se autovaiando, então, havia uma metalinguagem nisso que era perturbadora para a minha cabeça de 19 anos.

Com o Celso Salim foi performance musical, porque, honestamente, eu fui exigido até um ponto, que subi de nível como instrumentista. Com o Celso Salim foi rodar o circuito mesmo, tocar em tudo que é lugar, festivais, e, aí, comecei a compor meu primeiro disco, o Celso que produziu esse disco, junto com o Rafael Cury.

Nessas viagens que a gente fazia, agora lembrei, nós fomos para o Sul, para um lugar chamado Guarda do Embaú, e ficamos lá um tempo. Com a convivência, comecei a mostrar minhas músicas e o Celso falou: "Vamos fazer seu disco, são legais suas músicas". Eu queria fazer um disco instrumental. Eu nunca gostei de cantar, eu não me sinto um cantor, eu canto as músicas que eu faço para externalizar a música. Bem, eu estou falando isso porque o Crocodillo Gang era para ter sido instrumental, mas o Rafael Cury botou pilha, "Canta, canta". O disco é 60% cantado e 40% instrumental.

Paola Antony – Lembro-me muito bem do Crocodillo Gang e daquele momento cultural de Brasília.

Dillo – Sim, o lançamento foi incrível, pela GRV. Dessas coisas que não se explica, que eu não imaginaria nunca. Teve link no DF TV na passagem de som, saiu nos jornais, havia o exercício de filipeta nos bares, o Cabral saía em todos os bares distribuindo filipetas. Enfim, esse show entupiu e ficou mais gente do lado de fora do que dentro e o pessoal que ficou fora não foi embora. Foi no Teatro Martins Pena o show e eu era absolutamente desconhecido, era conhecido nesse meio do blues, do rock de Brasília, mas eu nunca imaginei, eu não tinha vivido isso ainda, e o show foi muito bom, modéstia à parte, foi incrível, emocionante, e as pessoas ainda falam desse show.

Paola Antony – E aí, Dillo, o que se passa na cabeça e no coração depois de lançar um disco que chegou com essa recepção?

Dillo – Foi o turning point, porque eu tive a oportunidade de ir para o Rio estudar música para cinema, pois, no fundo, eu sabia que estava tocando rock em inglês em Brasília, com influência de Ben Harper e Lenny Kravitz e que isso seria um gol de galinha e, aí, essa coisa de ir para o Rio de Janeiro, foi uma marretada absoluta. Foi o despertar para uma consciência nacionalista, para a canção em português, o idioma, o som do Jorge Ben Jor, do Tim Maia. Aquele guitarrista absolutamente influenciado por Eric Clapton, Ben Harper, Lenny Kravitz estava a fim de fazer música igual ao Jorge Ben.

Paola Antony – Foi por causa dessa vivência da brasilidade, então, que seu segundo disco, o Mestiço, já veio em português. E, aí, como você transferiu suas referências musicais de fora, em inglês, para dentro do Brasil?

Dillo – Assim que eu cheguei ao Rio, virei rato de museu. Vivia no Museu da Imagem e do Som. Ficava horas olhando o piano da Chiquinha Gonzaga, o bandolim do Jacob, as partituras do Ernesto Nazareth. Eu morava no Catete e ia para a rua Dois de Dezembro, que é a rua em que o Luiz Gonzaga morou, e ficava parado em frente ao prédio, olhando para a janela muito tempo, em uma viagem completamente isolada. Parecia um louco, parado, olhando para o prédio. Então, entrei na viagem da música brasileira e naqueles lugares, a padaria na rua Real Grandeza, em Botafogo, onde o Tim Maia vivia comendo sonho, porque o estúdio da PolyGram era ali perto, e o Tim Maia tinha conta naquela padaria. Conta que ele nunca pagou, ele só dava calote. Ele vivia de sonho, porque gostava de doce e era um pão que alimentava. Eu fui capturado por essa energia de brasilidade. Compus o Mestiço, um disco que prometia um monte, lançado pela Sony, ia ter música em novela, mas algumas coisas deram errado, bateram na trave, eu não tive o respaldo que imaginei que teria, pois me prometeram um monte de coisas que efetivamente não aconteceram. Eu estava no Rio e lancei o disco em Brasília, mas não teve nem de perto o burburinho que foi o Crocodillo Gang, e a galera que amava o Crocodillo Gang começou a me jogar para trás, tipo "Ah, o Dillo não é mais quem era, ele rompeu". Então, aquele movimento que foi criado acabou, naufragou. O Mestiço foi um disco meio fracassado no sentido de repercussão. Há músicas boas, algumas eternizadas, por exemplo, se eu for fazer um show e não tocar Estilhaço, que é uma música do Mestiço, a galera reclama, ou seja, houve momentos bons também.

Paola Antony – Do Mestiço e dessa história em torno dele você parte para o terceiro disco, Jacaretaguá, que foi um discão, né?

Dillo – Foi um discão, me ressuscitou, porque, com o naufrágio do Mestiço, eu fiquei na bad, pois tinha terminado o curso no Rio, terminado o relacionamento no Rio, então, voltei para Brasília, voltei a morar na casa da minha mãe, sabe?, aos trinta e poucos anos, não dava mais para recuperar aquele movimento que foi gerado com o Crocodillo Gang. Gravei o Jacaretaguá no meu quarto em Taguatinga.

O Marcos Paulo, do Estúdio Orbis, devo muito a ele, porque me emprestou coisas. Eu ia ao estúdio, pegava microfones, pré-amplificadores e levava para o meu quarto e montava. Eu já tinha o domínio dessas ferramentas, mas, óbvio, gravei algumas coisas no estúdio, como a bateria, que gravei no próprio Estúdio Orbis. Eu falei que gravei no meu quarto, porque a maioria das coisas foi gravada lá e esse cenário era muito impactante, porque eu tinha de arrastar a cama, colocar o colchão em pé, tampando a janela, para não vir o som da rua. Minha mãe mora a dez passos da avenida comercial, que é a mais movimentada de Taguatinga, então, a freada do ônibus, buzina, carro da pamonha, tudo vinha. Foi um disco para desengasgar, sabe? Por isso que é um disco do discurso violento, pesado. É um disco que disse que Brasília é perversa, elitista, que casamento é a companhia perfeita da solidão.


A entrevista completa de Dillo para o Cumbuca está em áudio, com uma seleção musical que percorre sua carreira e que pode ser conferida no SoundCloud da Rádio Eixo.


Acesse: https://soundcloud.com/radioeixo/cumbuca-dillo?in=radioeixo/sets/cumbuca




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